Joël Dicker: «Um passeio por Genebra»

Da cidade velha ao Jardim Inglês, passando pelo Lago Léman, Joël Dicker revela, neste texto, uma faceta desconhecida de Genebra, a sua cidade-natal. Eis o retrato pessoal de um lugar onde o tempo parece ter parado.

 

Há uma imagem de Genebra que está sempre comigo: a que a cidade oferece quando aterramos no aeroporto de Cointrin. Primeiro, sobrevoa-se o lago e as águas cor de esmeralda, únicas e inconfundíveis. Uma tonalidade que, vista do céu, parece por vezes transportar-nos ao Caribe. A verdade, contudo, é que estamos na Suíça – uma outra forma de paraíso.

Por que razão terá Genebra uma atmosfera tão agradável? Acima de tudo, creio que é um sentimento de serenidade e paz. É este o estado de espírito que se apodera de quem passeia pela cidade. Por um lado, é uma cidade pequena: não pode expandir-se devido à fronteira com a França e, além disso, o lago invade o centro urbano antes de se transformar no rio Ródano. De cada vez que saímos de Genebra, sabemos que regressaremos sempre a uma cidade igual à que deixámos. Aqui, sentimos que o tempo abrandou, ou pelo menos que não avança tão depressa como noutros lugares. Além disso, há a Natureza. O lago Léman, já mencionado, mas também as montanhas que o rodeiam, nomeadamente a cordilheira dos Alpes, que define o horizonte, vigia a cidade há milénios e ali permanecerá, mesmo daqui a milhares de anos.

A feição imutável de Genebra faz parte do dia-a-dia. O estilo arquitetónico e os edifícios antigos recordam-nos que a cidade pouco mudou ao longo do tempo.

 

Sob o olhar do Monte Branco

Se caminharmos a partir do Hôtel Les Bergues até ao centro da cidade, ficaremos encantados com o maciço do Monte Branco, pano de fundo que se ergue sobre a Europa a quase cinco mil metros de altitude.

Cruzando a ponte, seguimos para o Jardim Inglês, conhecido em todo o mundo pelo Relógio das Flores. Quando foi inaugurado, em 1854, era o único parque de estilo inglês da cidade (daí o seu nome). Se o atravessarmos, chegamos ao cais Gustave-Ador, nas margens do Léman. A curta distância, avista-se o Jet d’Eau, uma fonte que remonta ao século XIX, projetando água a 140 metros de altura, e que é um dos marcos da cidade.

O cais Gustave-Ador situa-se no bairro Les Eaux-Vives, um dos mais movimentados de Genebra. Vale a pena fazer ainda um desvio para conhecer os dois magníficos parques em frente ao lago: Les Eaux-Vives e La Grange, dois espaços verdes excecionalmente arborizadas, importantes pontos de encontro para os habitantes da cidade, sobretudo La Grange, onde há peças de teatro e concertos ao ar livre no verão.

A cidade tem um clima temperado, com invernos relativamente frios e verões muito agradáveis. Os habitantes de Genebra atribuem duas faces à sua cidade: no inverno, quando sopra o vento gelado e o céu permanece nublado, as ruas são cinzentas e desertas, e os habitantes locais são esquivos; assim que regressa o bom tempo, invadem-se as esplanadas e os parques, e proliferam os concertos e o cinema ao ar livre.

 

Do Rive à margem esquerda

Seguimos pelo bairro Les Eaux-Vives, em direção a Rond-Point de Rive. Se enveredarmos pela rua Les Eaux-Vives, uma das artérias mais importantes, veremos lojas, restaurantes e bares cheio de movimento.

Outrora uma importante entrada na cidade, o Rive é agora uma zona cheia de trânsito. Aí se situa o Halle de Rive, o mercado da cidade, além do Café Léo e do Robert, dois restaurantes icónicos. Seguindo pela avenida Émile-Jacques Dalcroze até ao cruzamento com a rua Théodore-de-Bèze, alcançamos o topo da colina do centro histórico. Neste itinerário, passamos diante do Collège Calvin, a instituição educativa mais antiga da cidade, fundada em 1559 por João Calvino, um dos pais da Reforma Protestante.

A rua Théodore-de-Bèze desemboca no passeio de Saint-Antoine, que separa o centro histórico do bairro Les Tranchées. Antes de entrar no coração de Genebra, é possível dar um breve passeio por Les Tranchées, que até ao século XIX foi um bastião de defesa da cidade velha. Hoje, é um belo bairro da margem esquerda, cheio de pequenos hotéis de charme, destacando-se a Igreja Russa, com as suas cúpulas folheadas a ouro. É também neste bairro que se situa o Museu de Arte e História, cujas coleções (nomeadamente de pintura suíça) justificam a visita.

 

O coração da cidade antiga

Saindo do museu e atravessando novamente o passeio de Saint-Antoine, chegamos ao centro histórico. Imediatamente, a arquitetura muda e mergulhamos na Genebra do século XVII. Aqui fica a praça Le Bourg-de-Four, um dos pontos nevrálgicos da cidade. Vários cafés partilham uma enorme esplanada, sempre apinhada no verão. Em redor, há edifícios de época que albergam espaços comerciais, e destaca-se o Palácio da Justiça. Sinto enorme alegria ao passear por estas ruas e descobrir os edifícios emblemáticos: a catedral protestante de São Pedro; o antigo arsenal, diante do qual estão vários canhões para as crianças escalarem; a Câmara Municipal, sede do cantão de Genebra. Podemos ainda subir até La Treille, situada no topo das antigas muralhas da cidade velha. Aqui encontramos o banco corrido mais longo do mundo, com 120 metros de comprimento. Descendo, chegamos à Place Neuve, que já foi também uma das entradas de Genebra. Daqui, avista-se o casco antigo, protegido pelos últimos vestígios das famosas muralhas. A Place Neuve é um dos centros nevrálgicos da cultura genebrina, já que aí se encontram o Grand Théâtre (teatro de ópera inspirado no parisiense Palais Garnier), o Conservatório de Música e o Museu Rath, dedicado às artes plásticas, que foi o primeiro museu público da Suíça. A Place Neuve confina com o parque Les Bastions, adorado pelos turistas e onde se situa o edifício histórico da Universidade de Genebra. A partir daqui, a rue de La Corraterie leva-nos à Place Bel-Air. Depois, podemos acompanhar o curso do Ródano até à ponte Les Bergues e atravessar para a margem direita, passando diante da ilha Rousseau, pequena mas muito bonita. Na outra extremidade da ponte, regressamos ao Hôtel des Bergues, lugar onde teve início esta deambulação.

 

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