Madalena Sá Fernandes: «Quando comecei, já não parei, foi uma avalanche»

Leme é uma avalanche. Uma onda rápida que nos atravessa e derruba. Por outro lado, é ternura. No seu primeiro livro, Madalena Sá Fernandes decidiu enfrentar os seus traumas e mostrar-nos a vida de uma criança num ambiente hostil, violento. Sobre ele, diz-nos Maria Filomena Mónica, «A Madalena fez a coisa mais difícil do mundo. Conseguiu escrever usando uma espécie de prosa poética, género que abomino, evitando todas as armadilhas. Foi ao mesmo tempo fria e terna. Poucos seriam capazes de contar assim a sua infância.».

O livro chegou às livrarias, pela Companhia das Letras, e a autora sente-se agora aliviada, em paz e feliz. Decidimos fazer-lhe algumas perguntas.

 

Estreias-te na literatura com um livro de autoficção, onde partilhas a tua própria história, mas sabemos que essa não era a tua ideia inicial. Precisavas de começar por aqui, «encerrar» primeiro este capítulo antes de partir para outros desafios na escrita?

Acredito que sim. A minha ideia inicial era escrever um romance, uma ficção, e comecei por aí. Durante o período no qual me propus a escrever, tentei escrever dois romances. Em ambos os casos, o que estava a escrever não me soava bem, soava artificial, não estava a encontrar o caminho. Além disso, uma pessoa específica da minha vida e um trauma meu pareciam querer imiscuir-se nas histórias que eu contava, quase uma imposição e, tanto num caso como noutro, essa pessoa aparecia sob a forma de personagem, mas deslocada da história que eu contava. Isto aconteceu sem que fosse a minha intenção, a personagem aparecia e começava a revelar-se, até que, a dado momento, eu percebia quem era. Uma espécie de perseguição através do meu inconsciente.

A dado momento, e um pouco frustrada, decidi largar a ideia que tinha e ir diretamente àquilo que precisava de contar e que parecia em mim querer ser contado.

 

Foi mais difícil começar este livro, ou dá-lo por terminado?

Foi mais difícil aceitar começá-lo. Estava em negação com a ideia de escrever sobre isto, não queria, tanto que tentei começar por outras histórias, mas houve um momento em que percebi que tinha de ser esta. E quando comecei, já não parei, foi uma avalanche.

 

És uma grande leitora, sabemo-lo. Quem dirias que foram as tuas maiores inspirações para escreveres este livro?

A Annie Ernaux foi sem dúvida a minha maior inspiração. Sempre admirei pessoas e mulheres que se narram. Também a Virgínia Woolf, a Marguerite Duras,  a Natalia Ginzburg, a Elena Ferrante e, mais recentemente, a Vanessa Springora me influenciaram.

 

Como tem sido a reação dos leitores?

Estão a ser muito bonitas e comoventes. Estou a receber muitas mensagens e a sentir um entusiasmo que me está a deixar feliz. Ao mesmo tempo, sinto-me aliviada. Muita gente está a dizer que devorou o livro, que não conseguiu pousá-lo, e está a ser muito bom ouvir isso.

 

O que podemos esperar no futuro?

Eu gostava de tentar o tal romance. Como leitora é o meu género literário favorito. Embora também queira um dia experimentar escrever uma peça de teatro, continuar a escrever crónicas, fazer uma compilação das mesmas, escrever um livro infantil. E, quem sabe, fazer mais alguma coisa autobiográfica. Gostava de explorar a escrita ao máximo e sob várias formas.

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