Como outros arquétipos fortíssimos na civilização humana, passe a redundância, a Mãe é fonte de muitas abordagens, pontos de vista e tratamentos literários desde o princípio dos tempos. Figura central da espécie, criadora de vida, referência máxima da família, a Mãe tem um magnetismo particular e uma influência tremenda no nosso imaginário. Naturalmente, os livros e a escrita contribuíram para essa importância, ao porem em lugar de destaque uma figura que tem muitas camadas e uma força ímpar, independentemente das vestes que lhe outorgamos ou do temperamento que atribuímos a personagens ancoradas nessa referência primordial. Da Mãe Coragem de Gorki à comicamente monstruosa Mrs Wormwood de Roald Dahl, encontramos inúmeras mães na Literatura que ajudaram a definir as nossas relações filiais, os nossos padrões de comportamento e até as formas de questionar uma aura de autoridade – e mesmo de santidade – quase absoluta. Gertrude, a rainha-mãe de Hamlet que vive sem remorsos; Margaret, a abusiva mãe de Carrie imaginada por Stephen King; Sofia, a mãe posta perante uma escolha impossível pela imaginação de William Styron; Clitemnestra, a progenitora vingativa que põe fim à vida do marido Agamémnon. Existe o chavão mãe, há só uma. Mas na verdade existem mães literárias para todos os gostos, inclusive sem filhos. Celebremo-las, lendo-as.
Ludmila Ulitskaya | Medeia e os Seus Filhos
Medeia é a inconfundível matriarca e o epicentro de uma família de ascendência grega que vive desde tempos imemoriais na costa da Crimeia. Viúva e sem filhos, enfermeira e católica ortodoxa, Medeia recebe todos os anos em sua casa a visita das gerações mais novas da família, vindas de Moscovo, Tbilisi ou Vilnius, para quem seria impensável passar as férias de Verão noutro sítio. Observando com interesse e recato os amores, os conflitos e as tragédias destes seus «filhos», tudo guardando no seu coração, Medeia revisita memórias antigas sobre a história dos seus antepassados e a sua própria biografia, marcada pelos anos da guerra e da fome, pela solidão, e por um segredo muito bem guardado.
Hugo Gonçalves | Filho da Mãe
Perto de fazer quarenta anos, Hugo Gonçalves recebeu o testamento do avô materno dentro de um saco de plástico. Iniciava-se nesse dia uma viagem, geográfica e pela memória, adiada há décadas. O primeiro e principal destino: a tarde em que recebeu a notícia da morte da mãe, a 13 de Março de 1985, quando regressava da escola primária. Durante mais de um ano, o escritor procurou pessoas e lugares, resgatando aquilo que o tempo e a fuga o tinham feito esquecer ou o que nem sequer sabia sobre a mãe. Um texto autobiográfico, tão comovente quanto surpreendente, sobre o que é crescer sem mãe. Lê-se como um romance, mas é feito de vida real.
Jessamine Chan | Escola Para Boas Mães
Frida Liu está exausta. Depois de ser abandonada pelo marido com uma filha pequena, vê-se obrigada a conciliar o trabalho a tempo parcial com a educação da pequena Harriet. Mas por mais que ame a filha e por muito que se esforce, nada parece ser suficiente. E tudo piora quando Frida tem um dia muito mau e se vê obrigada a deixar a menina sozinha em casa por algumas horas. O Estado tem vigiado mães como Frida: mulheres que deixam os filhos sem supervisão, que se distraem com outros afazeres. Frida perde a guarda de Harriet e é inserida num programa de reabilitação que visa formar mulheres para se tornarem boas mães. Uma distopia muito próxima daquilo que é a vida de todos os dias.
Possidónio Cachapa | Materna Doçura
«A mãe é uma doce prisão.» Ao perder tragicamente a mãe, Sacha entra numa busca desequilibrada para reencontrar a sua imagem no corpo e rosto de todas as mulheres. Viajando das ruas luminosas de Lisboa aos corredores escuros do metro parisiense, o protagonista perseguirá a figura maternal de forma obsessiva. Tem um buraco no peito que precisa desesperadamente preencher. Materna Doçura é um romance sobre o amor materno, mas, ao mesmo tempo, um manifesto humanista escrito com irreverência e imaginação, que leva o leitor da primeira à última página com uma voracidade feita de humor, emoção e drama.
Alia Trabucco Zerán | Limpa
Considerado pela crítica um romance «eletrificante», carregado de tensão até ao final, Limpa é uma poderosa exploração dos sentimentos contraditórios e das complexas relações de poder que se estabelecem entre dois mundos diferentes unidos debaixo do mesmo teto. Vinda do campo para a capital do país, Estela García encontra trabalho junto do abastado casal Jansen como criada de quarto e ama da sua filha recém-nascida, Julia, a mesma que educará e verá crescer, provocando despeito na mãe da criança. Serão sete anos divididos entre tarefas domésticas invisíveis e repetitivas e a falsa intimidade que estas proporcionam. A mãe de Estela aconselhou-a a não partir para a cidade. E no entanto…
Angelika Schrobsdorff | Tu Não És Como as Outras Mães
Enquanto jovem mulher, Else, uma menina mimada da burguesia de Berlim, fez duas promessas a si mesma: viver a vida intensamente e ter um filho de todos os homens que amasse. Tu não és como as outras mães é a história real dessa vida intensa, extravagante, inconformista que foi a de Else Kirschner, uma mulher verdadeiramente livre, e uma mãe diferente de todas as outras. Nascida na conservadora burguesia judia de Berlim, Else estava prometida para casar com um bom partido. Mas os encantos de um artista cristão – “o maior amor e pior partido da sua vida” – foram o trampolim que procurava para renunciar ao conforto da casa paterna e ser dona do seu destino num mundo cheio de promessa.
Magda Szabó | A Balada de Iza
Após a morte do marido, um juiz afastado do cargo por motivos políticos, Etelka deixa a sua casa na província e muda-se para o apartamento da filha na moderna e buliçosa Budapeste dos anos pós-Segunda Guerra Mundial. Iza, uma médica respeitada, diligente e militante como o pai, organiza a vida da mãe até ao último pormenor, procurando eliminar quaisquer vestígios do passado e da sua dor. No entanto, arredada de todas as tarefas e decisões, a frágil e nostálgica Etelka vê-se encurralada numa espécie de não-existência, silenciosa e solitária. Retrato da relação entre mãe e filha, crónica complexa de um desenraizamento, A Balada de Iza é igualmente a descrição fiel de uma sociedade húngara sob o peso do estalinismo e uma das obras maiores de Magda Szabó.
Jean-Jacques Felstein | Na Orquestra de Auschwitz
Uma história de não ficção literária; impressionante de sofrimento indescritível e do seu impacto nas gerações futuras. Enviada para Auschwitz em 1943, Elsa Miller sobreviveu ao campo de extermínio devido ao seu talento. Como violinista, teve a «oportunidade» de se juntar à orquestra feminina do campo, regida por Alma Rosé, sobrinha do famoso compositor Gustav Mahler. É este o segredo que Jean-Jacques Felstein, o filho de Elsa, descobre muito tempo após a morte prematura da mãe, que nunca lhe revelara nada acerca do seu passado. Ao tentar preencher o vazio que sente, segue os passos de Elsa e encontra sobreviventes da orquestra em vários países: Alemanha, Bélgica, Polónia, Israel e Estados Unidos da América.
Várias Autoras | Mães que Tudo
Mães que tudo reúne nove contos inéditos de escritoras portuguesas. Olhares singulares sobre ser mãe ou escolher não ser mãe, sobre ser filha ou mãe da nossa mãe. Histórias tão surpreendentes quanto comoventes de mães que ficam, mães que partem, mães que cuidam, mães que afastam, mães que sufocam, mães que libertam, mães que amam de menos ou de mais. Mães que tudo. Contos inéditos de Ana Margarida de Carvalho, Cláudia Clemente, Djaimilia Pereira de Almeida, Filipa Martins, Isabela Figueiredo, Isabel Lucas, Luísa Costa Gomes, Marlene Ferraz e Raquel Ribeiro.
Bernardine Evaristo | Rapariga, Mulher, Outra
De uma autora e obra premiadas, este é um retrato realista de uma sociedade multicultural que se confronta com a herança do seu passado e luta contra as contradições do presente. Mães, filhas, parentes, amigas: as doze personagens centrais deste romance a várias vozes levam vidas muito diferentes. Quase todas elas mulheres, negras e, de uma maneira ou de outra, resultado do legado do império colonial britânico. As suas histórias, a das suas famílias, amigos e amantes, compõem um retrato multifacetado e realista dos nossos dias, de uma sociedade multicultural que se confronta com a herança do seu passado e luta contra as contradições do presente.